O Futuro do Voluntariado no Brasil: um laboratório de líderes sustentáveis

Por Ricardo Voltolini, fundador e presidente da Ideia Sustentável – Estratégia e Inteligência em Sustentabilidade, com atuação em consultoria, educação e gestão de conhecimento em sustentabilidade, ética, diversidade, governança corporativa, responsabilidade social e investimento social privado.

No final dos anos 1990, quando surgiram os primeiros programas estruturados de voluntariado empresarial no Brasil, houve quem sentenciasse que teriam vida tão breve quanto o movimento de responsabilidade social no qual encontravam abrigo. Entre outras críticas, os céticos da época achavam que não cabia às empresas se “apropriarem” de um ato de vontade dos seus colaboradores (praticado, na maioria das vezes, em horário livre) para turbinar uma imagem de compromisso social. O tempo mostrou que estavam errados. Em duas décadas, o voluntariado nunca deixou de ter espaço na agenda corporativa – isso porque, quando bem conduzido, produz evidentes ganhos para empresas, colaboradores e comunidades.

Os benefícios para as comunidades são largamente conhecidos. O tempo, o dinheiro e o conhecimento de milhares de homens e mulheres, organizados ou não em movimentos de voluntariado empresarial, têm sido força motriz na melhoria da vida de crianças, pessoas com deficiência, adultos analfabetos, populações de baixa renda sem acesso à saúde, educação, trabalho, alimentação e saneamento básico. Constituem reserva de capital humano, intelectual e social de valor inestimável num país marcado por abismos sociais e econômicos. Formam uma rede de apoio, informal mas eficaz, muitas vezes à margem das políticas públicas.

Já os benefícios para os colaboradores tendem a ser menos tangíveis. Variam de pessoa para pessoa. E obedecem à mesma subjetividade que determina suas escolhas e motivações. Orientados por princípios religiosos, de cidadania ou mesmo de autogratificação, os indivíduos que se dedicam à atividade voluntária relatam, em comum, um tipo de retorno emocional que não pode ser mensurado por métricas convencionais de impacto. Ajudar o próximo, no entendimento da maioria dos voluntários, é um modo de conferir sentido à vida, alimentar a alma e buscar um estado de felicidade que só se completa quando se consegue diminuir a dor do outro ou fazê-lo feliz.  

Sobre as benesses para as empresas existe um razoável consenso. Amparada em princípios de solidariedade, altruísmo e cidadania, a ação voluntária equivale a um desejável pulsar de humanidade em organizações que, com o tempo, tornaram-se impessoais e distantes da realidade de suas comunidades. Exercitando-a, as empresas se descobriram mais empáticas. E entenderam, por tabela, que a empatia, além de valor em ascensão no mundo pós-pandemia, ajuda a construir (e fortalecer) vínculos de confiança imprescindíveis para atrair os melhores talentos e ganhar a admiração de clientes em tempos de employer branding ESG. Empresas são feitas de seres humanos que se mostram mais felizes, integrados e incluídos quando trabalham em organizações humanizadas nas quais se cultua o legítimo interesse pelo bem-estar do outro. Com a crescente mudança nas expectativas das sociedades em relação ao papel das empresas, as pessoas estão mais inclinadas a preferirem se relacionar com corporações íntegras, que pensam e agem como um cidadão decente. Nos dois casos, o voluntariado oferece substrato.

Estou convicto de que, nesse contexto de ascensão do ESG, o voluntariado corporativo – criterioso, bem gerido e integrado à cultura organizacional – pode ser mais do que as empresas enxergam nele. Vejo-o como uma espécie de laboratório de liderança sustentável num tempo em que líderes sustentáveis são, segundo o Fórum Econômico Mundial, fundamentais para conduzir a transição do business as usual para um modelo de empresa mais ética, transparente, e respeitosa em relação às pessoas e ao meio ambiente. A ação voluntária representa um set contemporâneo para o exercício de competências atitudinais esperadas no século 21, como cuidar de pessoas, promover a diversidade e inclusão, agir com ética (fazer o que é certo do jeito certo) e pensar de forma sistêmica e interdependente.

Como já escreveu Peter Senge, os melhores líderes de sustentabilidade estão nas “bordas” e não no centro das organizações. Eles só precisam de um ambiente propício para florescerem.

 

A Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, em sua terceira edição, legitima o trabalho de milhares de voluntários na construção de um Brasil melhor, tanto no presente, quanto para as gerações futuras.

Este artigo integra uma série de conteúdos escritos à convite dos realizadores da Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, com intuito de analisar e enriquecer os achados do estudo e não nos responsabilizamos pelas opiniões e conclusões aqui expressadas.