O Voluntariado Empresarial e o investimento social privado
Por Patrícia Loyola, diretora de Gestão e Comunicação da Comunitas, responsável pelo projeto BISC de investimento social corporativo.
Aprendi o valor do voluntariado nas empresas pelas quais passei. Confesso que até ingressar no meu primeiro emprego, não tinha o hábito de doar meu tempo, trabalho e talento em benefício de terceiros. Em minha trajetória profissional, tive inúmeras experiências como voluntária empresarial, desde atuações mais pontuais como reforma de espaços e limpeza de computadores revitalizados para doação, até ministrar aulas e mentorar jovens de comunidades vulneráveis de forma periódica. Os benefícios para mim como voluntária foram de diversas ordens, com inúmeros aprendizados e realizações.
Para além do impacto positivo no voluntário, os dados mostram que o voluntariado empresarial representa uma importante colaboração na construção do perfil do voluntariado em nosso País e tem ganhado amplo espaço na última década. Os dados da pesquisa BISC – Benchmarking do Investimento Social Corporativo, liderada pela Comunitas, acompanham desde 2008 essa agenda com diversas empresas. Em sua última edição, foram 324 empresas e 17 institutos/fundações empresariais.
Na última década, o voluntariado corporativo na Rede BISC passou por transformações significativas. Em 2010, os processos de acompanhamento dos programas careciam de informações cruciais para o planejamento e gestão: 20% das empresas não relataram o valor investido nesses programas; 30% não informaram sobre o número de voluntários e 94% sequer estimaram o número de horas trabalhadas pelos envolvidos.
Com o passar dos anos, tanto os programas quanto seus indicadores de gestão foram intensificados. Na última década, os investimentos da Rede BISC em programas de voluntariado variaram entre R$ 11,6 e R$ 16,6 milhões. Ainda nesse período, o percentual de colaboradores envolvidos a cada ano variou de 8% a 15% (mediana), percentual aquém do parâmetro internacional de 22% na média de 18 países, segundo o relatório Global Impact at Scale – 2020. (https://cecp.co/thought_leadership/global-impact-at-scale/).
Em 2017, houve um significativo recuo no voluntariado empresarial, o que foi considerado pela Rede BISC como uma consequência do impacto da crise econômica e, consequentemente, os desligamentos em massa de colaboradores e, portanto, o acúmulo de trabalho e funções. Tal realidade, ainda que momentânea, acabou por diminuir, em alguma medida, o ’clima‘ para a atuação voluntária.
No ano seguinte, os indicadores voltaram a subir e, em 2019, a pesquisa destacou a importância do envolvimento da liderança nas ações de voluntariado. Ao mesmo tempo em que houve um crescimento expressivo do envolvimento dos colaboradores, a participação intensa das lideranças em atividades voluntárias quase triplicou em três anos. Chegando a 2020, vivenciamos incontáveis desafios gerados pela covid-19 e, portanto, o voluntariado com seu forte teor presencial foi prejudicado. Naquele ano, o número de colaboradores voluntários da Rede BISC caiu 35% em relação ao ano anterior. Por outro lado, a crise sanitária fortaleceu estratégias como formação de rede de colaboração entre voluntários, voluntariado digital e doação casada, apesar de ter feito decrescer a liberação de horas de trabalho. O pro bono também ganhou força na pandemia. Essa modalidade é contabilizada na pesquisa BISC como a contribuição das empresas em forma de bens e serviços.
Visando apoiar as empresas em suas auto avaliações dos programas e refletir sobre as possibilidades de aprimoramentos futuros, o BISC construiu com a rede cinco dimensões relacionadas aos indicadores de qualidade listados a seguir por ordem decrescente de notas atribuídas no BISC 2020 aos programas de voluntariado empresarial: Desenho e gestão (8,7), Envolvimento institucional (8,6), Alianças estratégicas (8,0), Comunicação e mobilização (7,0) e Monitoramento, controle e avaliação (6,6).
Certamente, há espaço de melhoria em todas essas dimensões, no entanto, é no campo do monitoramento e da avaliação que as empresas apresentam as maiores dificuldades. Talvez, esse seja um ponto de atenção para que os programas de voluntariado sejam cada vez mais pensados e estruturados como instrumento estratégico para as empresas e suas contribuições sociais em âmbito local, regional, nacional e em agendas globais, tais como os ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e a agenda ESG – Environmental, Social, and Governance.
O voluntariado empresarial é caracterizado pela relação de ganha-ganha, na qual a empresa amplia o engajamento de seus colaboradores e abre frentes de capacitação prática a eles; o profissional vivencia maior realização e senso de propósito, ao mesmo tempo que tem a chance de desenvolver novas habilidades. Os beneficiários são fortalecidos em capacidades tão diversas quanto o leque de ações implementadas. Razões pelas quais vale a pena seguir investindo nessa prática para que os próximos dez anos sejam de ainda mais avanços e conquistas.
A Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, em sua terceira edição, legitima o trabalho de milhares de voluntários na construção de um Brasil melhor, tanto no presente, quanto para as gerações futuras.
Este artigo integra uma série de conteúdos escritos à convite dos realizadores da Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, com intuito de analisar e enriquecer os achados do estudo. Não nos responsabilizamos pelas opiniões e conclusões aqui expressadas.